terça-feira, 30 de junho de 2009

O Inverno do Avesso.


Ao longo destes meses, contei-te algumas peripécias desta outra história que resolvi contar.

Fui contando mais dos meus pensamentos que dos meus olhos. E, ao ver atrás, receio que não tenha explicado o suficiente ou tenha turvado a tua própria vontade, que talvez fosse mais saber como é do que como eu penso que é.

Perdoa-me o egoísmo. A verdade é que avisei. Eu disse-te que ia escrever para mim.

Não sei se é do calor. Se é do cheiro. Se é das pessoas. Se é do diário choque frontal com o desvalor da vida e a vulgaridade da morte. Se é de comer frango e arroz com as mãos numa cabana de lama e capim perdida ninguém sabe onde, com o rosto e a roupa cobertos de pó, sob o olhar envergonhado de uma velha senhora que responde com tecidos garridos e rugas esculpidas a escopro do tempo. Se é do sorriso sol que sai de meio metro e vinte quilos de gente, roto e descalço, à mais pequena carícia que lhe toca. Se é da consecutiva sinfonia de cores e formas que o céu toca todos os dias, cantando orgásmico a noite que chega, imperadora reclamando o seu lugar, uma música que se repete e repete, como se Deus passasse aqui todos os dias a caminho de casa para descansar.

Sei que, mais uma vez nesta vida, depois do Oriente, também o Sul faz dos olhos e dos pensamentos outros que não os que aqui chegaram.

É assim este Sul e é isto que ele faz. O sítio onde a água espira no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio e onde eu sou ser de Inverno.

1 comentário:

  1. Descritivo. Profundo. Fluído. Sentido.
    Um outro lado que não esperava! Lol.
    Pena que não continues a escrever!

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